segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

A LINGUAGEM

Perceba Eute amo algum lugar en-
tre dentes e olhos, morda mas
tome cuidado para não ferir, você tão
pouco quer tan-to. Palavras dizem tudo.
Eute amo de novo,
o que é vazio para. Pre-
encher. Encher. Ouvi palavras e palavras cheias
de buracos doendo. Fala é a boca.


Robert Creeley

domingo, 25 de novembro de 2007

¿Qué cosas lo divierten?

Roberto Bolaño - Desayunar en un bar al lado del mar y comerme un croissant leyendo el periódico. La literatura de Borges. La literatura de Bioy. La literatura de Bustos Domecq. Hacer el amor.

terça-feira, 11 de setembro de 2007

Três Poemas de Velimir Khlébnikov

Quando morrem, os cavalos - respiram,
Quando morrem, as ervas - secam,
Quando morrem, os sóis - se apagam,
Quando morrem, os homens - cantam.

1913
(Tradução: Haroldo de Campos)



Eu vi
Um vivo
Sol
Ou tom no
Outono
Só no
Sono
Azul.
Enquanto
Do canto
Dos teus calcanhares
Calcas os ares
Para o novelo
Da nebulosa,
Teu cotovelo
Em ângulo alvo
Alteando aos lábios.
Abril,
Abrir
A voz
As provas
De
Deus.
Consonha
Em vôo
Aberto
O abeto,
Colhe os
Olhos
Azuis
Com os laços
Das sobrancelhas
E dos pássaros
Cerúleos.
No anil
Há mil.

1919
(Tradução: Augusto de Campos e Boris Schnaiderman)



Uma vez mais, uma vez mais
Sou para você
Uma estrela.
Ai do marujo que tomar
O ângulo errado de marear
Por uma estrela:
Ele se despedaçará nas rochas,
Nos bancos sob o mar.
Ai de você, por tomar
O ângulo errado de amar
Comigo: você
Vai se despedaçar nas rochas
E as rochas hão de rir
Por fim
Como você riu
De mim.

1919-1921
(Tradução: Augusto de Campos)

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Eric Rohmer


"eles [os personagens de Eric Rohmer] confrontam a aparente liberdade de seus atos com a exigência de sua moral e se buscam em alguma parte entre a fé cristã, a aposta pascaliana, a certeza matemática e a tentação libertina"

Jean-Loup Passek, Dictionnaire du Cinema Français

domingo, 12 de agosto de 2007

L'Avventura, de Michelangelo Antonioni


Gradualmente, Claudia move sua cabeça na direção de Sandro. Seus olhos estão cheios de lágrimas. Ela o olha como se ele fosse alguém que a fizera sofrer muito. Ela se aproxima do banco onde ele está sentado. Sandro não se move nem um centímetro. Cláudia estende a mão na direção de Sandro, e, devagar, gentilmente, e com um aterrador senso de desespero, ela acaricia o seu cabelo. FIM.

Barthes/Antonioni


Penso em Matisse desenhando uma oliveira, de sua cama e, ao cabo de certo tempo, observando os vazios existentes entre os galhos, para descobrir que, com essa nova visão, escapava à imagem habitual do objeto desenhado, ao clichê "oliveira".Matisse descobria assim o princípio da arte oriental, que quer sempre pintar o vazio, ou melhor, que capta o objeto figurável no momento raro em que o pleno de sua identidade cai bruscamente num novo espaço, o do Interstício.De certa maneira, sua arte também é uma arte do Interstício ("A Aventura" seria a demonstração cabal dessa afirmação), portanto, de certa maneira também, sua arte tem alguma relação com o Oriente.
[...]

Caro Antonioni, tentei dizer com minha linguagem intelectual as razões que fazem de você, para além do cinema, um dos artistas de nosso tempo. Esse cumprimento não é simples, você sabe, pois ser artista hoje é uma situação não mais sustentada pela bela consciência de uma grande função sagrada ou social; já não é assumir, serenamente, um lugar no Panteão burguês dos Luminares da Humanidade; é, no momento de cada obra, precisar enfrentar em si mesmo os espectros da subjetividade moderna -pois já não se é sacerdote-, que são o desalento ideológico, a consciência social pesada, a atração e a aversão pela arte fácil, o tremor da responsabilidade, o incessante escrúpulo que dilacera o artista entre a solidão e o gregarismo. Cabe-lhe hoje, portanto, aproveitar este momento tranqüilo, harmonioso, reconciliado, em que toda uma coletividade está de acordo no reconhecimento, na admiração, no amor à sua obra. Pois amanhã recomeça o trabalho duro.

Roland Barthes sobre Michelangelo Antonioni




terça-feira, 3 de julho de 2007

OS PRAZERES DA PORTA

Os reis não tocam nas portas.

Não conhecem essa ventura: fazer avançar docemente ou com rudeza um desses grandes painéis familiares, voltar-se em sua direção para recolocá-lo no lugar - ter nos braços uma porta.
... A ventura de empunhar no ventre pelo nó de porcelana um desses altos obstáculos de um cômodo; o corpo-a-corpo rápido pelo qual por um instante o passo se detém, o olho se abre e o corpo inteiro se acomoda ao seu novo aposento.
Com a mão amiga retém ainda, antes de empurrá-la decididamente e encerrar-se -
o que o estalido da mola potente mas bem azeitada agradavelmente lhe assegura.

Francis Ponge (Tradução: Adalberto Müller Jr. e Carlos Loria)

sábado, 23 de junho de 2007

AUTOBIOGRAFIA 4 IDEM

Voz: Você vê o tom púrpura que tomou o céu?
Outra voz: Eu diria malva, é quase malva.
V.: Existe alguma diferença?
O.V.: Uma tem mais rosa.
V.: Qual?
O.V.: Qual o quê?
V.: Qual tem mais rosa?
O.V.: Eu realmente não sei.
V.: Então, como você pode...
O.V.: Soa correto, para essa cor.
V.: Você vai sempre pelo som?
O.V.: Som?
V.: O som, o...
O.V.: O que isso quer dizer "ir pelo som"?
V.: Quero dizer às vezes que começa com sons – nada além. Você persegue, você...
O.V.: Sons musicais?
V.: Não, menos articulados.
O.V.: Como os sons ao nosso redor agora?
V.: Não, como os sons ao nosso redor agora.
O.V.: Sons que não pode ouvir.
V.: Sons que não pode ouvir.
O.V.: Você escuta sons que não pode ouvir?
V.: Não.
O.V.: Não?
V.: É antes de ouvir.
O.V.: Antes de ouvir?
V.: Ouvir é atenção. Antes da atenção.
O.V.: Malva: "Púrpura delicado, violeta ou lilás".
V.: Púrpura: "Um tom de cor entre o azul e o vermelho; uma das cores usualmente chamada de violeta, lilás, malva etc."
O.V.: Não e mesmo.
V.: Não e mesmo.
O.V.: Não como mesmo.
V.: Não mesmo.
O.V.: Mesmo não mesmo.
V.: A forma está completa aos 36.
O.V.: Magenta.

Michael Palmer (Tradução: Régis Bonvicino)

sexta-feira, 22 de junho de 2007

O que falamos quando falamos de amor - Raymond Carver


[...]

.....Mel derrubou seu copo. Derramou-o sobre a mesa.
.
.....- O gim se foi. - Mel disse.
.
.....Terri perguntou, "E agora?"
.
.....Eu conseguia ouvir meu coração batendo. Eu conseguia ouvir o coração de todo mundo. Eu conseguia ouvir o ruído humano que nós, sentados lá, fazíamos, nenhum de nós se movendo, nem mesmo quando a cozinha ficou escura.

terça-feira, 19 de junho de 2007

terça-feira, 5 de junho de 2007

olho muito tempo o corpo de um poema

olho muito tempo o corpo de um poema
até perder de vista o que não seja corpo
e sentir separado dentre os dentes
um filete de sangue
nas gengivas

Ana Cristina Cesar

quarta-feira, 30 de maio de 2007

MEU CORAÇÃO

Não vou chorar o tempo todo,
também não vou rir o tempo todo
não prefiro um "gênero" ao outro.
Quero ter a imediatez de um filme ruim,
não só os de repente bons, mas também a nova
super-produção recém-lançada. Quero estar
tão vivo quanto o que é vulgar, pelo menos. E se
algum aficcionado da minha tralha vier a dizer:"Isso
mal parece que é do Frank!", ótimo! Eu
não uso terno cinza ou marrom o tempo todo,
uso? Eu não. Vou à ópera de camisa,
muitas vezes. Quero os pés descalços,
o rosto barbeado, e o coração —
não dá pra planejar o coração, mas
a melhor parte dele, a minha poesia, é aberta.

Frank O'Hara (tradução Luiza Franco Moreira)

sábado, 26 de maio de 2007

O MENDIGO

o velho se perguntou se valia
....um Mondrian
....ou a sujeira do chão onde se sonha
a própria vida