quarta-feira, 7 de maio de 2014

é essa música

está tudo ali é nossa
em 1991 mal tinhamos nascido e
um certo malestar no ar ela
é sobre isso também
tem muito disso e de
como nossos pais se
viraram para ficar alertas
(falharam) essa falha a
frustração a revolta são
também nossos na medida
que fomos também um
erro de percurso como todo
momento brilhante dum
solo de guitarra.

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

minha perneta onde quer que você esteja
eu imagino porque sei que tipo de lugares
você ainda que tenha pensado bem num
bem impossível é ali mesmo onde eu
vejo você porque já faz muito tempo
mas eu guardo o endereço do fotolog
onde mais esconder se numa confissão
(onde mais? você perguntava a ninguém
em 2005 e hoje deve fazer a mesma
pergunta a ninguém a diferença é que
ali era uma pergunta aqui um convite
à revolta, não que eu tenha visto você
uma vez na rua sem a perna de sempre
mas com um capuz cobrindo o rosto, mas

porque eu sei que tipo de coisas acontecem.

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

é estranho mas você disse
alguma coisa eu lembro
de ter um copo na mão, e
um cachorro de rua passou
e um engravatado sem
gravata passou e depois
alguém gritou algo e
você disse que devia
estar louco (eu o louco
que gritava com o cão
ou o cara a quem faltava
a gravata?), ou será que
foi antes, eu disse "é
estranho", e era estranho
alguém disse
que eu estava louco
o outro disse que eu
prefiro ser um cachorro
que engravatado, o
outro de repente tirou
uma máscara de pirata
o sujeito do bar disse
"é loucura, rapaz",
o outro de repente
destruiu o bar chamando
você de "CÃO", foi
então (ou depois?)
que um bando de
encapuzados anunciou
o fim da ditadura dos
engravatados o dono
do bar, que tinha uma
ânfora tatuada na testa
careca disse que era
loucura, rapazes
fazer a revolução num
bar de piratas.

quinta-feira, 23 de maio de 2013

fantasmas em santa cecília

há duas razões para olhar pra você
ver uma outra coisa não você agora
ver a fantasia de você um tempo atrás:

1. algumas coisas são perenes,
alguns dos fantasmas da adolescência 
o são
você foi fantasma por excelência;

2. não dá pra te olhar e não descer
uma vez mais a albuquerque lins, não
aprender de novo as lições introdutórias
do azar

é que
tem um minhocão ali, um pequeno vexame
uma quase tragédia, tem alguma coisa que
é o que você era para mim ali onde
eu vejo você agora. 

sábado, 15 de dezembro de 2012

fechadas as janelas dos apartamentos
que até anteontem ocuparam - como
se ocupar fosse possível o vazio, já
não é a primeira vez que esses módulos
são sucessivamente habitados e
abandonados, só que dessa vez como
das outras, olhando as janelas pregadas
parece que é a última nunca será
porque não se pode habitar nem
abandonar o que não é nada, os
que viveram ali quando viveram
viveram em lugar nenhum não
viveram nada não deixaram nada
deixaram: as migalhas os
cigarros o cartaz da internacional
situacionista e um celular e sua
epistolografia.


segunda-feira, 1 de outubro de 2012


se desse para imaginar
que vinte e três anos depois
aquela viagem pra ubatuba
seria material de uma exposição
de fotos e um livro de história
estaria numa cicatriz, num dente
perdido, na cara de um cara
de vinte e dois anos, se

                                      no fim aquela
névoa de madrugada de um verão
frio não tivesse sido névoa inconsequente
verão anárquico frio e madrugada
clandestina, ou

será que não aconteceu nada
e o que depois foi "anarquia total"
não tivesse sido só um fim de semana
nas toninhas? 

sexta-feira, 24 de junho de 2011

a

g.b,
no ateliê de gravura
com tintura preta nas mãos
e no avental preto, preto
também na garrafa de vinho
e na testa: uma máquina
de sonhos acordados
e uma série de bobagens,
como quando disse

à filha do aviador que iria
fazer um molde de tijolos
e com os tijolos que saíssem
dali, faria uma casa para
viverem, na casa

um ateliê para trabalharem,
lerem trabalhar cansa,
beberem vinho, ali ele faria
umas gravuras de aviões
do tipo do que o pai dela dirige
do tipo dela, do tipo do que está
gravado em metal no verso
daqui.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

aclimação

sem muitas idéias na cabeça
ou pelo menos se idéia um
conceito, bem pouco

tudo o que tem ali, ali estão:
uma música, um animal, uma
casa na aclimação

tudo aberto, se idéia um modo
de trocar as palavras sem no final
muito sentido, então sim

podemos dizer: tem muitas
idéias na cabeça, olhando
dali:

ela uma casa caicó
papagaio.

domingo, 31 de outubro de 2010

ela odeia o ócio
da poltrona ultra-moderna,
prefere o ócio da praça
do por-do-sol - ali, tem
sonhos de protesto,
a tudo - quando vê
um picho no topo
de um prédio queria
ter estado ali, queria
ter estado ali onde
j.m. basquiat m. ali
r. mapplethorpe j. genet
j. cousteau y. gagarin
às vezes, w. burroughs
(em tânger, imaginem)
- qualquer lugar, menos
a casa, qualquer pessoa
- queria ser um outro,
ela tem 17 - pensa em
liberdade o tempo todo
e tem horas que chega
a impasses  de fazer
coçar os olhos
 -  como:
uma obra de protesto
à arte num museu é
ainda obra de protesto?
(e se ela for obradearte?)
- é uma falsificação, ela
desconfia quando toma banhos
periódicos a contra-gosto,
e faz aula de escrita criativa
porque não gostam do que
escreve.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

não tem nada,
a casa quase não tem mobília,
só em algum canto um quadro:
uma praia em cabo-verde; do lado tem um skate e
um sofá sofisticado demais pra quem tem
quase só um sofá. ali, numa festa – o toca-discos
toca groundation (é incrível, uma música boa
faz parecer mais natural e gracioso: as caras
de tédio, os bicos) – umas dez pessoas,
se eu chegasse para uma delas,
ela talvez antes de saber o meu nome, diria:
“o que você fez?”, e eu: “eu escrevi
LEE está perdido, é uma peça” “sobre o que?”
“sobre um cachorro que se perde”, ela
vai soltar um aaaaaaah, e tchau,
ou pode se interessar, mas por uns segundos
porque chegou um francês que faz grafites.
eu olho pro quadro, a próxima vai se passar
em cabo verde ou numa praia qualquer -
na baleia, você vai estar nessa peça
porque não faz sentido
você não estar aqui.

sábado, 25 de setembro de 2010

carta do pão com manteiga


Embora não fosse minha a casa    
As primeiras frutas florescendo na
Janela tinham o mesmo cheiro.


Kenneth Rextroth

terça-feira, 7 de setembro de 2010

o professor, astor,
abriu sua mala cheia
de cachimbos, ele escreveu
um livro chamado “matemática criativa”,
que tem um nome bem bonito,
estamos em 1992, ele já ensinou
matemática pra muita gente
agora não ensina mais,
me lembro que era
um pouco doidão,
como tudo em
1992.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

exposição de ana b.

são quatro fotos:
uma um quadrado
azul e uma mancha
azul; uma paisagem -
as quatro são paisagens;
uma uma mancha azul
num fundo de outra
cor; a última a fotógrafa,
ana b.
essa também uma paisagem
e uma mancha

ana b., vinte anos revela
que suas influências são:
shoegazing, ollie-air,
pina baush

ela acende um
cigarro, atrás
a janela dá pra ver
o Pacaembu, e

se a noite fosse uma
década, ana b. era de
papel de arroz.

domingo, 9 de maio de 2010

curta

z. larga a garrafa e
põe marc ribot
y los cubanos postizos
no toca-cedês acende
um basê de olhos
fechados diz eu queria
dan-çar, sabe?

abre os olhos vermelho
é a cor da felicidade
em copo old-fashioned.

domingo, 11 de abril de 2010

o que sobrou tem a cor
do gim com campari
e uma rodela de laranja
do diâmetro de um sol
que cabe num copo,
das suas mãos abertas
depois de esfregar
os olhos de sono
que é a mesma
da pétala de violeta
guardada no meio de
nove estórias –j.d.salinger
-editora do autôr-1975,
vinte anos depois.

domingo, 21 de fevereiro de 2010

algumas notícias
de lá: chove forte
mais uma vez
em são paulo/
b. avisa que a
baleia segue viva/
ela diz que não
vem mas que
gostaria muito
de vir/j.b. me
pede pra mandar
notícias (eu mando)/
a.a. está no paraguay/
de você soube
sem querer que
está no deserto
do atacama,
espero todas com
muita apreensão
às vezes é como
estar-lá,
no deserto.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

cartão-postal


um homem
com a tatuagem
de um lagarto tosco
só linhas mas
muito bonito
nas costas ele
vive na
na praia
da brava e
me disse

estive lá em
sãopaulo é
muito fácil
se perder
eu
dei o fora
antes que
perdesse
tudo
.

[picho "samo" - jm basquiat]






terça-feira, 26 de janeiro de 2010

em todos os lugares que estivemos
alguns apertados duros cansados
às vezes num café na beira
da praia dos ossos, paralelos aos fios
elétricos do trem metropolitano e
dentro e fora na casa de um amigo
que não estava bem das pernas
em festas tristes cheias de pose
sentados lendo aqui e ali você
sempre ali e eu aqui você nunca
leu o cléo e daniel que eu te dei
já li uns livros muito bons
alguns ruins também
nenhum como estar-ali
onde você sempre
está.
 

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010



todos os meus amigos,
você também
mesmo os fugazes
e os que já não,
o que virou flores
no quadro do max ernest
era meu amigo,
todos eles
e você
à noite em sãopaulo
o som e o som
da cidade é o som
da voz de
todos os meus amigos.

[quadro de wesley duke lee]

domingo, 10 de janeiro de 2010


ver e estar ali
onde você também
é muito bom
porque muita gente
vaievém
é ano novo
e todo mundo
parece saber
até o cão, menos eu
e então tá todo mundo
indo, eu não
até que você diz:
vem aqui,
eu vou e você está
com uma garrafa de
alguma coisa
pretende ir pro mar
a qualquer momento
e tem planos
não pro ano
mas você quer nadar
quando o dia viér
e ir até ali
e então nós vamos
e é muito bom
mesmo.

[quadro de max ernest / rendezvous of friends - the friend become flowers]

sexta-feira, 4 de abril de 2008

Porque eu não sou pintor

Eu não sou pintor, sou poeta.
Por quê? Eu acho que preferiria ser
pintor, mas não sou. Bem,


por exemplo, Mike Goldberg
começa um quadro. Eu dou
uma passada. "Senta e bebe alguma coisa",
ele diz. Eu bebo; nós bebemos. Eu dou
uma olhada."Você pôs SARDINHAS neste."
"É, precisava de alguma coisa ali."
"Ah." Eu vou e os dias vão-se
e dou outra passada. O quadro
está indo, e eu vou, e os dias
vão-se. Dou uma passada. O quadro está
pronto. "Cadê SARDINHAS?"
Tudo o que sobrou são
letras, "Estava exagerado", diz Mike.


E eu? Um dia começo a pensar sobre
uma cor: laranja. Eu escrevo um verso
sobre laranja. Não demora a tornar-se
uma página inteira de palavras, não de versos.
Então, mais uma página. Deveria ter
tantas coisas mais, não de laranja, de
palavras, de como laranja é horrível,
e a vida. Dias vão-se. É assim mesmo
em prosa, eu sou poeta de verdade. Meu poema
está pronto e eu ainda não mencionei
laranja. São doze poemas, eu chamo de
LARANJAS. E um dia numa galeria
eu vejo o quadro de Mike, chamado SARDINHAS.

Frank O'Hara (tradução: Ricardo Domeneck)

Corte transversal do poema

A música do espaço pára, a noite se divide em dois      pedaços.
Uma menina grande, morena, que andava na minha cabeça,
fica com um braço de fora.
Alguém anda a construir uma escada pros meus sonhos.
Um anjo cinzento bate as asas
em torno da lâmpada.
Meu pensamento desloca uma perna,
o ouvido esquerdo do céu não ouve a queixa dos namorados.
Eu sou o olho dum marinheiro morto na Índia,
um olho andando, com duas pernas.
O sexo da vizinha espera a noite se dilatar, a força do homem.
A outra metade da noite foge do mundo, empinando os seios.
Só tenho o outro lado da energia,
me dissolvem no tempo que virá, não me lembro mais quem sou.

                                                                  Murilo Mendes

segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

A LINGUAGEM

Perceba Eute amo algum lugar en-
tre dentes e olhos, morda mas
tome cuidado para não ferir, você tão
pouco quer tan-to. Palavras dizem tudo.
Eute amo de novo,
o que é vazio para. Pre-
encher. Encher. Ouvi palavras e palavras cheias
de buracos doendo. Fala é a boca.


Robert Creeley

domingo, 25 de novembro de 2007

¿Qué cosas lo divierten?

Roberto Bolaño - Desayunar en un bar al lado del mar y comerme un croissant leyendo el periódico. La literatura de Borges. La literatura de Bioy. La literatura de Bustos Domecq. Hacer el amor.

terça-feira, 11 de setembro de 2007

Três Poemas de Velimir Khlébnikov

Quando morrem, os cavalos - respiram,
Quando morrem, as ervas - secam,
Quando morrem, os sóis - se apagam,
Quando morrem, os homens - cantam.

1913
(Tradução: Haroldo de Campos)



Eu vi
Um vivo
Sol
Ou tom no
Outono
Só no
Sono
Azul.
Enquanto
Do canto
Dos teus calcanhares
Calcas os ares
Para o novelo
Da nebulosa,
Teu cotovelo
Em ângulo alvo
Alteando aos lábios.
Abril,
Abrir
A voz
As provas
De
Deus.
Consonha
Em vôo
Aberto
O abeto,
Colhe os
Olhos
Azuis
Com os laços
Das sobrancelhas
E dos pássaros
Cerúleos.
No anil
Há mil.

1919
(Tradução: Augusto de Campos e Boris Schnaiderman)



Uma vez mais, uma vez mais
Sou para você
Uma estrela.
Ai do marujo que tomar
O ângulo errado de marear
Por uma estrela:
Ele se despedaçará nas rochas,
Nos bancos sob o mar.
Ai de você, por tomar
O ângulo errado de amar
Comigo: você
Vai se despedaçar nas rochas
E as rochas hão de rir
Por fim
Como você riu
De mim.

1919-1921
(Tradução: Augusto de Campos)

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Eric Rohmer


"eles [os personagens de Eric Rohmer] confrontam a aparente liberdade de seus atos com a exigência de sua moral e se buscam em alguma parte entre a fé cristã, a aposta pascaliana, a certeza matemática e a tentação libertina"

Jean-Loup Passek, Dictionnaire du Cinema Français

domingo, 12 de agosto de 2007

L'Avventura, de Michelangelo Antonioni


Gradualmente, Claudia move sua cabeça na direção de Sandro. Seus olhos estão cheios de lágrimas. Ela o olha como se ele fosse alguém que a fizera sofrer muito. Ela se aproxima do banco onde ele está sentado. Sandro não se move nem um centímetro. Cláudia estende a mão na direção de Sandro, e, devagar, gentilmente, e com um aterrador senso de desespero, ela acaricia o seu cabelo. FIM.

Barthes/Antonioni


Penso em Matisse desenhando uma oliveira, de sua cama e, ao cabo de certo tempo, observando os vazios existentes entre os galhos, para descobrir que, com essa nova visão, escapava à imagem habitual do objeto desenhado, ao clichê "oliveira".Matisse descobria assim o princípio da arte oriental, que quer sempre pintar o vazio, ou melhor, que capta o objeto figurável no momento raro em que o pleno de sua identidade cai bruscamente num novo espaço, o do Interstício.De certa maneira, sua arte também é uma arte do Interstício ("A Aventura" seria a demonstração cabal dessa afirmação), portanto, de certa maneira também, sua arte tem alguma relação com o Oriente.
[...]

Caro Antonioni, tentei dizer com minha linguagem intelectual as razões que fazem de você, para além do cinema, um dos artistas de nosso tempo. Esse cumprimento não é simples, você sabe, pois ser artista hoje é uma situação não mais sustentada pela bela consciência de uma grande função sagrada ou social; já não é assumir, serenamente, um lugar no Panteão burguês dos Luminares da Humanidade; é, no momento de cada obra, precisar enfrentar em si mesmo os espectros da subjetividade moderna -pois já não se é sacerdote-, que são o desalento ideológico, a consciência social pesada, a atração e a aversão pela arte fácil, o tremor da responsabilidade, o incessante escrúpulo que dilacera o artista entre a solidão e o gregarismo. Cabe-lhe hoje, portanto, aproveitar este momento tranqüilo, harmonioso, reconciliado, em que toda uma coletividade está de acordo no reconhecimento, na admiração, no amor à sua obra. Pois amanhã recomeça o trabalho duro.

Roland Barthes sobre Michelangelo Antonioni




terça-feira, 3 de julho de 2007

OS PRAZERES DA PORTA

Os reis não tocam nas portas.

Não conhecem essa ventura: fazer avançar docemente ou com rudeza um desses grandes painéis familiares, voltar-se em sua direção para recolocá-lo no lugar - ter nos braços uma porta.
... A ventura de empunhar no ventre pelo nó de porcelana um desses altos obstáculos de um cômodo; o corpo-a-corpo rápido pelo qual por um instante o passo se detém, o olho se abre e o corpo inteiro se acomoda ao seu novo aposento.
Com a mão amiga retém ainda, antes de empurrá-la decididamente e encerrar-se -
o que o estalido da mola potente mas bem azeitada agradavelmente lhe assegura.

Francis Ponge (Tradução: Adalberto Müller Jr. e Carlos Loria)

sábado, 23 de junho de 2007

AUTOBIOGRAFIA 4 IDEM

Voz: Você vê o tom púrpura que tomou o céu?
Outra voz: Eu diria malva, é quase malva.
V.: Existe alguma diferença?
O.V.: Uma tem mais rosa.
V.: Qual?
O.V.: Qual o quê?
V.: Qual tem mais rosa?
O.V.: Eu realmente não sei.
V.: Então, como você pode...
O.V.: Soa correto, para essa cor.
V.: Você vai sempre pelo som?
O.V.: Som?
V.: O som, o...
O.V.: O que isso quer dizer "ir pelo som"?
V.: Quero dizer às vezes que começa com sons – nada além. Você persegue, você...
O.V.: Sons musicais?
V.: Não, menos articulados.
O.V.: Como os sons ao nosso redor agora?
V.: Não, como os sons ao nosso redor agora.
O.V.: Sons que não pode ouvir.
V.: Sons que não pode ouvir.
O.V.: Você escuta sons que não pode ouvir?
V.: Não.
O.V.: Não?
V.: É antes de ouvir.
O.V.: Antes de ouvir?
V.: Ouvir é atenção. Antes da atenção.
O.V.: Malva: "Púrpura delicado, violeta ou lilás".
V.: Púrpura: "Um tom de cor entre o azul e o vermelho; uma das cores usualmente chamada de violeta, lilás, malva etc."
O.V.: Não e mesmo.
V.: Não e mesmo.
O.V.: Não como mesmo.
V.: Não mesmo.
O.V.: Mesmo não mesmo.
V.: A forma está completa aos 36.
O.V.: Magenta.

Michael Palmer (Tradução: Régis Bonvicino)

sexta-feira, 22 de junho de 2007

O que falamos quando falamos de amor - Raymond Carver


[...]

.....Mel derrubou seu copo. Derramou-o sobre a mesa.
.
.....- O gim se foi. - Mel disse.
.
.....Terri perguntou, "E agora?"
.
.....Eu conseguia ouvir meu coração batendo. Eu conseguia ouvir o coração de todo mundo. Eu conseguia ouvir o ruído humano que nós, sentados lá, fazíamos, nenhum de nós se movendo, nem mesmo quando a cozinha ficou escura.

terça-feira, 19 de junho de 2007

terça-feira, 5 de junho de 2007

olho muito tempo o corpo de um poema

olho muito tempo o corpo de um poema
até perder de vista o que não seja corpo
e sentir separado dentre os dentes
um filete de sangue
nas gengivas

Ana Cristina Cesar

quarta-feira, 30 de maio de 2007

MEU CORAÇÃO

Não vou chorar o tempo todo,
também não vou rir o tempo todo
não prefiro um "gênero" ao outro.
Quero ter a imediatez de um filme ruim,
não só os de repente bons, mas também a nova
super-produção recém-lançada. Quero estar
tão vivo quanto o que é vulgar, pelo menos. E se
algum aficcionado da minha tralha vier a dizer:"Isso
mal parece que é do Frank!", ótimo! Eu
não uso terno cinza ou marrom o tempo todo,
uso? Eu não. Vou à ópera de camisa,
muitas vezes. Quero os pés descalços,
o rosto barbeado, e o coração —
não dá pra planejar o coração, mas
a melhor parte dele, a minha poesia, é aberta.

Frank O'Hara (tradução Luiza Franco Moreira)

sábado, 26 de maio de 2007

O MENDIGO

o velho se perguntou se valia
....um Mondrian
....ou a sujeira do chão onde se sonha
a própria vida